quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Após o pleito

É a manhã seguinte de um dia importante, seria mesmo? Depois de tanta movimentação, tanto vai-e-vem, agora era o silêncio da madrugada. Sem urnas, sem vencedor, sem emoção. Sempre tenso, chato e tedioso o  domingo de pleito.
Do finzinho do horizonte via-se claridade, o velhinho sentado no degrau de cimento batido furtava do chão os últimos instantes de sossego, enquanto um cãozinho passeava pronto para aliviar-se numa árvore próxima. Na calçada não via-se a cor do cimento, um mosaico estranho, como um tapete amassado de figuras disformes e distantes.
Centenas, milhares de pequenos papéis de sonhos e promessas, numerados por um código único que usaríamos para conceder poderes num ciclo de mais quatro anos. "Que sujeira", pensava o senhor alheio ao movimento dos primeiros ônibus da manhã. "Que maravilha" pensava o cão enquanto limpava as patinhas no mais apático deputado caracterizado nos pequenos folhetos sagrados.
O senhor levantou-se, iria até a padaria, desgastado com a sujeira em sua calçada, com a política e com a dor no joelho esquerdo. Saltitando feliz ao seu encalço ia o cãozinho, com a patinhas limpas, com as orelhas empinadas e com os olhos brilhantes ao roubar para si os aromas matinais da panificadora. Seria tão bom ser um vira-lata.



Caio A. Leite - 07/10/10

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