domingo, 25 de dezembro de 2011

Feliz Natal


Já era noite da véspera de Natal. A decoração estava impecável. A árvore estava repleta de bolas, anjinhos e no topo a grande estrela de Belém. Os presentes estavam sob a tal árvore, só seriam entregues depois da meia-noite. Os pisca-piscas contornavam toda a casa, se enrolavam na velha árvore da calçada e assim destacavam a moradia que em outras épocas do ano ficava oculta pela negra noite. Os talheres ainda arrumados, as taças ainda inteiras, as crianças brincando lá fora. Todos os convidados já haviam chegado. A TV transmitia inutilmente qualquer especial de fim de ano. No céu, rojões tímidos estouravam uma hora aqui outra ali – os pequenos animais do condomínio estavam desesperados, latiam sem parar. O clima estava quente, mas uma ínfima sensação de umidade dava a impressão de que ainda choveria.

Longe de toda essa baderna natalina, no cômodo mais alto e mais afastado da casa o homem admirava a janela da pequena lavanderia. A fantasia fora colocada há algum tempo – deixara a barba postiça de lado, colocaria no grande momento. A noite foi avançando, de quando em quando uma empregada trazia algo de comer e beber. “Essa noite vou ganhar uma grana preta, só pra entregar meia dúzia de presentes” – pensou o Papai Noel com um sorriso ambicioso no rosto. “Todo Natal é assim, alguma família grã-fina me dá uns cascalhos para fazer a alegria dessas crianças idiotas”. Lá fora a chuva começou a cair, a janela ficou aberta e o piso sendo molhado sorrateiramente.
“Até que essa chuvinha refrescou, mas ainda tô com um calor danado”. Tirou do saco vermelho um presente nada ortodoxo, uma garrafa de vinho barato que ganhara de alguém. Encheu o copo e bebeu, comeu um pedaço de torta. Comia, bebia, comia, bebia, bebia, bebia, bebia. De gole em gole a garrafa ficou vazia. O cérebro foi ficando confuso e as imagens difusas. Ficou com raiva do Natal, amaldiçoou meio mundo com nomes feios. Olhou no relógio e estava tão ébrio que pensou que um dos ponteiros havia caído. Mas rapidamente constatou que faltava menos de um minuto pra hora desejada. Pegou a barba, colocou de qualquer jeito no rosto, levantou rapidamente e num passo em falso acabou escorregando na pequena poça que a chuva deixara. Sem controle do corpo caiu no varal e se enroscou todo, em desespero começou a se debater para tirar os cordões de aço que lhe marcavam a pele. No meio dessa agonia, sem ver pra onde ia, o corpo foi em direção à janela escancarada. Levou só alguns segundos para o baque final.
E então por toda a cidade, dezenas ou centenas de Papais-Noéis também estavam com suas roupas vermelhas, suas barbas longas, seus capuzes felpudos, com suas botas e com seus trenós estacionados em algum lugar. Eles surgiam dos fundos das casas, das janelas ou das garagens. Vinham com seus sininhos e com os sacos cheios de presentes. Abraçavam e beijavam as meninas, os meninos, as senhoras e os senhores. Sentaram nas cadeiras reservadas – os olhos de todos brilhavam com a falsa maravilha do lendário Bom velhinho. Feliz Natal!

- Caio Augusto Leite

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