sábado, 31 de dezembro de 2011

Bonança


Debruçado na janela observava a chuva que caía e que açoitava as flores no canteiro, pobres margaridas, rosas e violetas que resistiam com firmeza o véu d’água que desabava. Os cachorros de rua abrigaram-se, os pássaros em algum galho protegido, os ratos e outros animais estariam por aí – em algum oco de árvore, em alguma toca ou até mesmo dentro das casas. A lâmpada vacilava a cada raio que iluminava o céu, o trovão ecoava com mais vigor dentro daquela moradia, pois era quieta e vazia. A solidão fazia os sons ecoarem com mais profundidade e tristeza, parecia que o eco saía do próprio peito órfão do rapaz na janela. É que ali, naquela cidade, ninguém queria saber da sua dor – é que a sua dor era meio banal perto da dor dos outros. O sofrimento só é engrandecido quando vem acompanhado de uma desgraça descomunal. Sim, sofrer de saudade era muito banal.
Mas ainda era verão e essa tempestade não iria durar mais tanto, com certeza mais uns dez minutos e tudo voltaria ao normal. E estava repleto de razão, as nuvens cansaram de chover e por trás delas um solzinho tímido conduzia seus raios pelo quintal encharcado. Rebrilhava alguma semente de esperança no coração do homem – pequena e frágil semente de mamão. O rapaz espreguiçou-se e foi até o quintal, sujou seus pés com lama. Um arremedo de sorriso perpassou os lábios frios e secos e tudo estava lindo sob a luz clara do astro-rei. Nada parecia triste e mesmo as flores despedaçadas pela chuva inspiravam certa fascinação no olhar do moço. O tempo corria e sob o vento da efemeridade, as nuvens, as flores e as dores eram diluídas incansavelmente. O homem suspirou e aproveitou aquele momento raro antes que ele também se acabasse.

- Caio Augusto Leite

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