quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Da plenitude




     Era preciso escolher um dentre os três escrínios. Não era uma decisão fácil, pois ninguém sabia o conteúdo deles. Havia muita ponderação, medo do risco, lágrimas rolavam com a perspectiva do erro. Mas não havia tempo para esperar uma resolução da vida.  Só ele podia apontar o dedo e dizer: Eu escolho esse do meio, ou da esquerda, ou da direita? Por que não podemos ficar com todos? Mas não resistiu e acabou por escolher e na escolha encontrou apenas três moedas de ouro, era a prosperidade material...                              
     Viveu alguns anos com todos os prazeres da vida, os luxos, os regalos, tudo de lindo estava dentro do seu alcance, mas sentia que faltava alguma coisa e negociando, com seu dinheiro, conseguiu a chance de trocar o escrínio. Dessa vez tirou de dentro dele uma pena e um par de óculos: era o saber mais puro.                                                                       
     Sabia de tudo, todas as esferas do conhecimento, as fórmulas, os cálculos, as artes, os ritmos, as métricas. Nada ficava longe dos seus olhos atentos e da sua mente extremamente treinada para entender todos os fenômenos existentes. E por saber tanto, sabia que faltava algo e usando da sua astúcia trocou novamente os escrínios. E pela última vez abriu a tampa e retirou um coração sangrando enrolado em um pano de seda. Tinha em mãos o próprio amor, o amor de todas as eras.                                                                        
    Amou, amou sim. E teve todos os sorrisos, beijos, toques e esperanças que só esse sentimento pode trazer. Mas por amar demais, também sofria, pois sabia que ainda faltava alguma coisa. Não tendo ouro e nem sabedoria, não podia trocar de destino. Sendo apenas mais um apaixonado, tomou uma decisão radical: jogou todos os escrínios no fogo ardente da eternidade. E sem nem um tipo de algema que o prendesse, seguiu seu caminho com a felicidade mais primitiva. É uma pena, não teremos a plenitude e sendo assim a total ausência de tudo é a única maneira de ser pleno, mesmo não sendo.



- Caio Augusto Leite

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